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30 de ago. de 2009

La imagen

Hay un punto en que esto y aquello, piedras y plumas, se funden. Y ese momento no está antes ni después, al principio o al fin de los tiempos. No es paraíso natal o prenatal ni cielo ultraterrestre. No vive en el reino de la sucesión, que es precisamente el de los contrários relativos, sino que está en cada momento. Es cada momento. Es el tiempo mismo engendrándose, manándose, abriéndose a un acabar que es un continuo empezar. Chorro, fuente. Ahí, en el seno del existir – o mejor, del existiéndose -, piedras y plumas, lo ligero y lo pesado, nacerse y morirse, serse, son uno y lo mismo.   El conocimiento que nos proponen las doctrinas orientales no es trasmisible en fórmulas o razonamientos. La verdad es una experiência y cada uno debe intentarla por su cuenta y riesgo. La doctrina nos muestra el camino, pero nadie puede caminarlo por nosotros. De ahí la importancia de las técnicas de meditación. El aprendizaje no consiste en la acumulación de conocimientos, sino en la afinación del cuerpo y del espíritu. La miditación no nos enseña nada, excepto el olvido de todas las enseñanzas y la renuncia a todos los conocimientos. Al cabo de estas pruebas, sabemos menos pero estamos más ligeros; podemos emprender el viaje y afrontar la mirada vertiginosa y vacía de la verdad. Vertiginosa en su inmovilidad; vacía en su plenitud. [...] Pensar es respirar. Retener el aliento, detener la circulación de la idea: hacer el vacío para que aflore el ser. Pensar es respirar porque pensamiento y vida no son universos separados sino vasos comunicantes: esto es aquello.  
Octavio Paz. El arco y la lira. p.103.

29 de ago. de 2009

Uma parada. Simples assim.


Paradeiro

Arnaldo Antunes

Haverá paradeiro para o nosso desejo
Dentro ou fora de um vício
Uns preferem dinheiro
Outros querem um passeio perto do precipício
Haverá paraíso
Sem perder o juízo e sem morrer
Haverá pára-raio
Para o nosso desmaio
Num momento preciso
Uns vão de pára-quedas
Outros juntam moedas antes do prejuízo
Num momento propício
Haverá paradeiro para isso?
Haverá paradeiro
Para o nosso desejo
Dentro ou fora de nós?
Haverá paraíso

25 de ago. de 2009

ilumina

The moon had
a cat`s moustache
For a second

A lua ganhou
um bigode de gato,
Por um segundo


Useless, useless,
The heavy rain
Driving into the sea

Inútil, inútil,
pancada de chuva
Em direção ao mar

Jack Kerouac

22 de ago. de 2009

llubia negra

quanto cabe em um negrume de chuva?

[...]
lembra?
[pressinto o mover indeciso de uma boca iminente colando-se ao ecrã de cristal líquido]
esse sol reluziria tão alto e algo que sem dúvida ou quê que fizesse desconfiar lhe escrutinaria a retina cansada unindo nossas ilhas de edições de luxo
[aura se soft é outro modo de exclamar ura se not e ora se não]
meu luxo eldorado,
te contei ajuntando assim: de uma por uma e mais outra
cadinho e cádmio com cânhamo
não mais um fio de nylon em que elas contas – ou você, um conto – formasse um colar, um condão azul indingo
não: cada ponto que formava teu rosto eu deixei esparso, mixturação dentro de um não-se-sabe-ao-certo se tijela, cabaça ou copo de cachaça... não lembramos. sei que cabiam na mão, aliás, elas estavam, você, tudo solto – mas sem esparramar. era incrível luxo! não caía nem se escapava qual o vendaval revolto de sempre
- a estrada...
você ficava quieto, num instante, uma paisagem que movia só a orbe escusa de dentro das pálpebras cerradas que de tanto trânsito emerge em deformação > você ora farejava saber se a vida acontecia ao redor ora (!) você sorria e dançava com os dedos enlaçados aos dela
.en-transe.

[...]

qual o espaço para a abertura de uma carta de amor no tempo do desgarro? não se sabe pior um papel de dobradilhas e redondilhas lleno de circunvoluções viajeras desnudado de um envelope objeto voador mal e porcamente identificado na trincheiras,
um rolo bemdizê pergaminho escorregando-se com afeição sobre um loooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooongo
tapete vermelho – que eu preciso e prefiro dizer r o j o -,
se um bilhete suado entre fartos seios amarrados e imiscuídos para ser entregue às escusas quando da hora da ciesta,
ou se isto: contra os minutos atabalhoados do relógio de areia dentro dele,
ecrã
a areia a estrada a carta o amor a b e r t o fomentando dedos o crédito o débito os reais as monedas que tilintam o peito sorrindo sem importar se grande é a distância do estrangeiro umapresençapramaisperto um adendo outro ardendo e uma pena flutuando depois de despregar-se do frangalho ataúde e amiúde

[...]


você se esgoela
e tenta prender o movimento num flash com o fundo em preto quem branco na parede esta grafia convulsa que mais verte um amontoado de contextos metidos em pretextos infalíveis e imbatíveis – você bem vê por los anteojos que cinema se faz de vestígios de memórias nos pés por aí pedalando afoitos até que pisem por descuido um dedo de boa e velha prosa começando por um ai! e terminando a perder de vista o incêndio de um telhado em revoada deixando a descoberto paredes e calhas e rebocos contando pelancas feridas em flor de coagulações que vestem lilás porque purple beibe,
purple rains

[...]

de pois em pois, foi deter-se aí para que tudo semoventes de si
astros cadentes e carentes de espetáculo em plena trajetória dois andares e andaimes de vinhetas venetas varetas veredas com linhas brancas e marcadores amarelos no negrume de um chão batido a cimento e caligrafia porosa que, nu instante de um qualquer anúncio à visão, lá está:
o pacote aberto o caderno deserto o cristalino desperto
fixo uma clave e denota uma gota: cruzada de bala no vidro trás vis a vis uma fumaça em suspeição – fogo não há mas um opaco de cinzas contidas no olor que espremece em reações o rosto rugoso
faróis acinzentados detectam o humo sob um estranho que vinha embotinado em desalinho pelo estrado retilíneo dos trilhos e digo mais


Flávia Memória

21 de ago. de 2009


Mês do cachorro louco. Sem fim.

passo


Micromovimento

[2]

I.
fico pensando nas modulações de um rosto nas
modulações de uma fala como se houvesse
por detrás de um rosto fixo de uma fala fixa
algo que modula algo
que ondula os movimentos sutis da sobrancelha
dos lábios os movimentos sutis dos lábios se apertando se contraindo
encontrando os dentes como se algo
modulasse estes micro-movimentos uma onda
uma cascata uma queda forte d`água uma espera
necessária de um rio que segue e espera a cheia
e retorna como as modulações da maré a oscilação da maré
algo tão natural quanto isto ou quanto a espera do sol de manhã

II.
nas modulações de um rosto haveria uma alternância de graus
de temperaturas uma alternância gradual em que seria possível até
medir graus de oscilação graus em que as cores se adensam ou se diluem
se compõem ou decompõem se unem ou se separam
modular não seria diferente de pintar misturar as cores diluir as cores
matizar esticar uma linha delimitar contornar não seria
diferente de estar aqui olhar pela varanda olhar por cima do teu ombro
a desordem da casa olhar por cima do teu ombro e rever a temperatura na varanda
alguns graus acima ou abaixo não seria diferente de
dar-se por satisfeita em meio à desordem ou em meio ao excesso
de ordem e cotidiano espalhados pela casa

III.
modular poderia ser algo próximo a encontrar
um breve ponto de apoio nos olhos de alguém que te olha
fortuitamente de alguém que te olha com o receio e a rapidez
necessários para mudar o rumo de um assunto modular
um assunto é algo próximo a isto:
você estende as mãos tão cheias tão repletas de coisas
que rapidamente a modulação se dá há um encontro um breve
encontro de olhos como em um fotograma congelado
mas tudo se passa tão rápido que você não tem tempo de virar a cabeça
algo se passa e você é violentamente conduzido numa cascata
e há sobretudo um esquecimento que sobra e esvazia a cena
como se nada tivesse acontecido de fato

Anitta Costa Malufe
(na Coyote n. 19)

20 de ago. de 2009

A mais perfeita imagem


Se eu varresse todas as manhãs as pequenas
agulhas que caem deste arbusto e o chão que
lhe dá casa, teria uma metáfora perfeita para
o que me levou a desamar-te. Se todas as manhãs
lavasse esta janela e, no fulgor do vidro, além
do meu reflexo, sentisse distrair-se a transparência
que o nada representa, veria que o arbusto não passa
de um inferno, ausente o decassílabo da chama.
Se todas as manhãs olhasse a teia a enfeitar-lhe os
ramos, também a entendia, a essa imperfeição
de Maio a Agosto que lhe corrompe os fios e lhes
desarma geometria. E a cor. Mesmo se agora visse
este poema em tom de conclusão, notaria como o seu
verso cresce, sem rimar, numa prosódia incerta e
descontínua que foge ao meu comum. O devagar do
vento, a erosão. Veria que a saudade pertence a outra
teia de outro tempo, não é daqui, mas se emprestou
a um neurônio meu, uma memória que teima ainda
uma qualquer beleza: o fogo de uma pira funerária.
A mais perfeita imagem da arte. E do adeus.


Ana Luísa Amaral
(tirado da Coyote n. 19)

17 de ago. de 2009

Díptico

A verdade é que na poesia
de seu depois dos cinqüenta
nessa meditação areal
em que ele se desfez, quem tenta

encontrará ainda cristais,
formas vivas, na fala frouxa,
que devolvem seu dom antigo
de fazer poesia com coisas.

*

Na Mauritânia só deserto,
no seu texto de areia frouxa,
se descobre a rose de sable,
cristal de verso em plena prosa.

Rosa de areia, se fez forma,
se fez rosa, areia empedrada;
aglutinou sua areia solta,
se vertebrou numa metáfora.

João Cabral de Melo Neto

16 de ago. de 2009

vendaval

Um deus também é o vento
só se vê nos seus efeitos
árvores em pânico
bandeiras
água trêmula
navios a zarpar

me ensina
a sofrer sem ser visto
a gozar em silêncio
o meu próprio passar
nunca duas vezes
no mesmo lugar

a este deus
que levanta a poeira dos caminhos
os levando a voar
consagro este suspiro

nele cresça
até virar vendaval

Leminski

15 de ago. de 2009

lema

o amor, esse sufoco,
agora há pouco era muito,
agora, apenas um sopro

ah, troço de louco,
corações trocando rosas,
e socos






Aço em flor


Quem nunca viu
que a flor, a faca e a fera
tanto fez como tanto faz,
e a forte flor que a faca faz
na fraca carne
um pouco menos, um pouco mais,
quem nunca viu
a ternura que vai
no fio da lâmina samurai,
esse, nunca vai ser capaz.


P. Leminski

12 de ago. de 2009

laços, elos, alianças...

Drão


Drão, o amor da gente é como um grão
Uma semente de ilusão
Tem que morrer pra germinar
Plantar n'algum lugar
Ressucitar no chão nossa semeadura
Quem poderá fazer, aquele amor morrer
Nossa caminha dura
Dura caminhada, pela estrada escura

Drão não pense na separação
Não despedace o coração
O verdadeiro amor é vão
Entende-se infinito, imenso monolito
Nossa arquitetura
Quem poderá fazer, aquele amor morrer
Nossa caminha dura, cama de tatame
Pela vida afora

Drão os meninos são todos sãos
Os pecados são todos meus
Deus sabe a minha confissão
Não há o que perdoar
Por isso mesmo é que há
De haver mais compaixão
Quem poderá fazer, aquele amor morrer
Se o amor é como um grão
Morre nasce trigo
Vive morre pão
Drão, Drão